Quando o mundo pára
Hoje eu acordei com um passarinho cantando na minha janela. Achei estranho, mas muito agradável. Levantei, tomei banho, tomei café, e parti para mais um dia habitual. No elevador eu encontrei dois vizinhos; um deles nunca fala comigo. Mas não é que hoje ele falou. Aliás, os dois estavam com uma felicidade tão grande estampada na cara que eu – às vezes eu fico tão desligado do mundo que perco a noção de tempo, e do resto – fiquei me perguntando se o Brasil tinha sido campeão mundial de alguma coisa.
Como de costume, assim que liguei o carro, liguei o rádio. Coisa estranha, o locutor do programa de humor que eu sempre escuto tinha faltado, e estava sendo substituído por uma mulher, que pediu desculpas pela ausência do titular e ficou colocando músicas só pra preencher o tempo. Isso me deixou um pouco chateado; eu adoro ouvir as besteiras daquele idiota. Agora eu ia rir de que naquele trânsito lento e caótico?
Mas o trânsito não estava lento, nem caótico. Eu não via a cidade daquele jeito desde o ano passado, num domingo, lá pelas seis da manhã – eu tinha decidido mudar de vida: acordar cedo todos os dias, e mais outras dessas resoluções que não duram nem um dia inteiro. Estava tudo numa tranqüilidade; pouquíssimos carros. E os que estavam nas ruas eram guiados por motoristas tão cordiais. Nessa hora eu tive absoluta certeza de que o Brasil tinha sido campeão mundial de alguma coisa. Por qual outro motivo as pessoas estariam tão felizes e obsequiosas nesse país? Eu já estava começando a ficar com a impressão que eu era o único que não sabia. Fiquei tão absorto pensando sobre isso que, não prestei atenção no sinal que mudava de cor. Atrás de mim uma mulher irada buzinava e gritava algo que eu não consegui decifrar.
Batata! É futebol. O Brasil tinha sido campeão do mundo de futebol e eu não sabia. É, porque tem muitas mulheres que ficariam muito felizes com essa besteira, mas sempre tem as que odeiam o futebol ferrenhamente; deve ser culpa dos maridos delas. Caramba! Percebi o quanto eu estava alheio ao mundo. Sai o mais rápido que pude. E não pude deixar de ficar puto só de pensar que perdi meu programa de humor, favorito, por causa de uma porra de copa do mundo. O idiota deve ter bebido todas e não pode ir trabalhar – O pior é quando eles bebem todas e vão trabalhar.
No caminho que eu faço pra ir ao trabalho, que é o mais longo, mas, o mais bonito, existem algumas floriculturas. Eu fiquei abestalhado ao notar como elas estavam cheias; todas estavam cheias. Também não pude deixar de reparar, igualmente abestalhado, nas filas de carros na frente dos lava-jatos. Ta bom; eu vou confessar uma coisa: eu não tava tão impressionado com aquilo não. Afinal de contas esse mundo é doido mesmo né? Mas, quando eu vi aquela quantidade de carros na frente dos salões de beleza, e pude verificar através das suas portas diáfanas que, todos os clientes eram homens; nessa hora eu fiquei realmente admirado.
Segui meu caminho. Fui pensando sobre a insanidade desse mundo, sobre esse comportamento intempestivo de toda a cidade. Quando voltei a atinar pra uma coisa: não era a cidade toda que estava fora do normal; eram os homens. De repente descobri tudo. Eles estavam felizes e conseqüentemente mais gentis; queriam flores, os carros limpos; eles precisavam estar mais bonitos. Não haveria outra explicação: Ela está solteira outra vez...
por Heitor Freitas (convidado)
Como de costume, assim que liguei o carro, liguei o rádio. Coisa estranha, o locutor do programa de humor que eu sempre escuto tinha faltado, e estava sendo substituído por uma mulher, que pediu desculpas pela ausência do titular e ficou colocando músicas só pra preencher o tempo. Isso me deixou um pouco chateado; eu adoro ouvir as besteiras daquele idiota. Agora eu ia rir de que naquele trânsito lento e caótico?
Mas o trânsito não estava lento, nem caótico. Eu não via a cidade daquele jeito desde o ano passado, num domingo, lá pelas seis da manhã – eu tinha decidido mudar de vida: acordar cedo todos os dias, e mais outras dessas resoluções que não duram nem um dia inteiro. Estava tudo numa tranqüilidade; pouquíssimos carros. E os que estavam nas ruas eram guiados por motoristas tão cordiais. Nessa hora eu tive absoluta certeza de que o Brasil tinha sido campeão mundial de alguma coisa. Por qual outro motivo as pessoas estariam tão felizes e obsequiosas nesse país? Eu já estava começando a ficar com a impressão que eu era o único que não sabia. Fiquei tão absorto pensando sobre isso que, não prestei atenção no sinal que mudava de cor. Atrás de mim uma mulher irada buzinava e gritava algo que eu não consegui decifrar.
Batata! É futebol. O Brasil tinha sido campeão do mundo de futebol e eu não sabia. É, porque tem muitas mulheres que ficariam muito felizes com essa besteira, mas sempre tem as que odeiam o futebol ferrenhamente; deve ser culpa dos maridos delas. Caramba! Percebi o quanto eu estava alheio ao mundo. Sai o mais rápido que pude. E não pude deixar de ficar puto só de pensar que perdi meu programa de humor, favorito, por causa de uma porra de copa do mundo. O idiota deve ter bebido todas e não pode ir trabalhar – O pior é quando eles bebem todas e vão trabalhar.
No caminho que eu faço pra ir ao trabalho, que é o mais longo, mas, o mais bonito, existem algumas floriculturas. Eu fiquei abestalhado ao notar como elas estavam cheias; todas estavam cheias. Também não pude deixar de reparar, igualmente abestalhado, nas filas de carros na frente dos lava-jatos. Ta bom; eu vou confessar uma coisa: eu não tava tão impressionado com aquilo não. Afinal de contas esse mundo é doido mesmo né? Mas, quando eu vi aquela quantidade de carros na frente dos salões de beleza, e pude verificar através das suas portas diáfanas que, todos os clientes eram homens; nessa hora eu fiquei realmente admirado.
Segui meu caminho. Fui pensando sobre a insanidade desse mundo, sobre esse comportamento intempestivo de toda a cidade. Quando voltei a atinar pra uma coisa: não era a cidade toda que estava fora do normal; eram os homens. De repente descobri tudo. Eles estavam felizes e conseqüentemente mais gentis; queriam flores, os carros limpos; eles precisavam estar mais bonitos. Não haveria outra explicação: Ela está solteira outra vez...
por Heitor Freitas (convidado)